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terça-feira, 3 de novembro de 2009

"TAMO JUNTO"


Minha peça "Sudatorium" - "a da sauna", como já vem sendo chamada - estreou na virada do domingo para a segunda, feriado, nas Satyrianas. Foi um momento mágico para mim. O Teatro do Ator, na Praça Roosevelt, estava totalmente lotado, com mais de100 espectadores - havia até cadeiras extras, que tiveram de ser colocadas para tentar acomodar todo mundo. E, mesmo assim, não deu. Vi gente dando meia volta na fila, quando disseram que os ingressos haviam se esgotado. Amigos ligaram se desculpando por não terem conseguido entrar. Ainda estou digerindo tudo isso. Estou pensando bastante e tenho muita coisa a dizer sobre o que aconteceu e o futuro da peça - mas não será agora. Nesse momento, eu quero apenas agradecer a quatro pessoas fundamentais nessa história: Edu Brisa, Adriano Merlini, Carlos Sobrinho e Edson Aranha. O Edu já é meu parceiro de algum tempo. Fizemos algumas coisas juntos e admiro muito seu trabalho como ator, diretor e dramaturgo. Foi ele quem dirigiu essa montagem de "Sudatorium". O tempo, apertadíssimo, não foi obstáculo para eles. O Edu conseguiu dar forma à peça e, com competência e a habitual generosidade, extraiu o que pôde dos atores. Ah, os atores... Adri, Carlão e Edson - que estão na foto acima, clicada pelo meu amigo Sugis - foram verdadeiros guerreiros. Decoraram o texto em pouco tempo e deram vida aos três personagens - que agora são mais deles do que meus. Tiraram aquelas palavras do papel e as atiraram no palco. Para mim, como dramaturgo, é incrível a sensação de ver/ ouvir aquelas falas que eu escrevi há algum tempo, e que fazem todo sentido para mim, sendo ditas por eles, fazendo sentido para eles também e, finalmente, indo parar nos ouvidos, mentes e corações da plateia - e fazendo sentido para ela também. Ouvi comentários muito bacanas de várias pessoas que assistiram à peça. Agora é pensar para frente. Vamos levar "Sudatorium" para Curitiba, no grande festival de teatro que acontece lá, em março. Depois, vamos colocá-la em cartaz e tentar ficar o máximo de tempo nos palcos em 2010. O time é esse aí. E como o Edu costuma dizer: "Tamo junto!"

sexta-feira, 30 de outubro de 2009

ANIVERSÁRIO + SAUNA


Meus queridos e minhas queridas, hoje é meu aniversário. Nos e-mails que disparei pra galera, escrevi que completo 24 primeveras. Não colou. Fui alvo de chacota. Devia ter arriscado uns 33, 34. Agora, estou dizendo que foi erro de digitação: inverti os dois números. Mas o fato é que tenho um duplo convite para fazer a todos vocês, caríssimos. Hoje à noite, vou receber os amigos e as amigas no Finnegan's Pub (Rua Cristiano Vianna, 358, Pinheiros - esquina com a Rua Artur de Azevedo), a partir das 22h. O bar estará em clima de Halloween, com música ao vivo (pop, rock, indie, glam), gente de preto, etc. Reservei uma mesa grande, no andar de cima, onde é mais tranquilo e dá pra conversar. Portanto, é para gregos e troianos: agito embaixo, chill out em cima. Não paga nada pra entrar, mas paga pra sair. (He he, desculpem, não resisti.) Homem $13; mulher $10. Gostaria muito de ver quem não vejo faz tempo e rever quem está comigo no dia-a-dia. Segundo, minha peça "Sudatorium", a da sauna, foi selecionada para as Satyrianas 2009. Será apresentada no Teatro do Ator (Praça Roosevelt, 172, Centro), no dia 02/11, à 0h30 (virada do domingo para a segunda, feriado). Estão todos convidados. No último post, disse que era de graça. Desculpem, errei. Ou quase: na verdade custa $2 (dois reais). É o valor mínimo. Quem quiser paga mais. É o sistema adotado nas Satyrianas deste ano. O flyer de "Sudatorium" está, mais uma vez, aí em cima. Gosto muito desta foto. Ela é soturna, como é o clima da peça. Espero que seja o começo de uma bela carreira para essa sauna.

Três amigos de muito tempo estão relaxando, suando em bicas e jogando conversa fora. Papo vem, papo vai, e a temperatura começa a subir. Em todos os sentidos. Antigas rusgas reaparecem em meio ao calor. Pequenas frustrações emergem do suadouro. Quarentões, percebem que chegaram à metade de suas vidas. E, de uma hora para outra, querem passar tudo isso a limpo. No meio de uma sauna.

"Sudatorium", de Paulo Cunha
Direção: Edu Brisa
Com Adriano Merlini, Carlos Sobrinho e Edson Aranha
Segunda 02/11, 0h30, virada do domingo para segunda - Nas Satyrianas 2009
Teatro do Ator - Praça Roosevelt, 172, Centro.
R$ 2,00 (valor mínimo). Quem quiser, paga mais.

quarta-feira, 28 de outubro de 2009

SUDATORIUM NAS SATYRIANAS 2009


Três amigos de muito tempo estão relaxando, suando em bicas e jogando conversa fora. Papo vem, papo vai, e a temperatura começa a subir. Em todos os sentidos. Antigas rusgas reaparecem em meio ao calor. Pequenas frustrações emergem do suadouro. Quarentões, percebem que chegaram à metade de suas vidas. E, de uma hora para outra, querem passar tudo isso a limpo. No meio de uma sauna.

Sudatorium, de Paulo Cunha
Direção: Edu Brisa
Com Adriano Merlini, Carlos Sobrinho e Edson Aranha
Segunda 02/11, 0h30, virada do domingo para segunda - Nas Satyrianas 2009
Teatro do Ator - Praça Roosevelt, 172, Centro.
Grátis.

terça-feira, 20 de outubro de 2009

SATYRIANAS COM SAUNA

Minha peça "Sudatorium" foi selecionada para a Satyrianas 2009. Para quem ainda não conhece, a Satyrianas é uma grande festa de teatro, com 78 horas ininterruptas (de 30/10 a 02/11) de peças, minicenas e performances, que acontece na Praça Roosevelt e arredores, com apoio da Secretaria Municipal de Cultura. "Sudatorium", mais conhecida como "a peça da sauna", foi escrita no começo deste ano. Quero aproveitar e agradecer a Roberto Alvim, que acompanhou todo o processo de escritura, e deu toques pertinentes e esclarecedores. Em maio, o texto recebeu uma leitura encenada, no Club Noir, e repercutiu muito bem. Eu mesmo dirigi e convidei atores amigos meus, que tiraram as palavras do papel e as lançaram no palco. Também agradeço a eles - em especial ao meu brother Fabio Takeo, que, com seu talento e dedicação extraordinários, deu ao personagem Aldo uma dimensão que ele não tinha. Mas agora, para a apresentação na Satyrianas, tudo mudou. Primeiro, decidi passar a direção para mãos mais experientes e competentes que as minhas - chamei meu velho parceiro Edu Brisa. E, por conta de compromissos de trabalho dos atores que fizeram a leitura, tive que mudar todo o elenco. Pelo que conheço dos novos atores - Adriano Merlini, Carlos Sobrinho e Edson Aranha -, a peça tem tudo para dar certo, mais uma vez. Adriano é meu companheiro de cena na peça ("Destinos") que estamos ensaiando com o Grupo XIX. Trabalha também com o Folias, já o vi em cena em "Querô" e gosto muito do seu trabalho. Carlão também está comigo no XIX, sei o quanto o cara é disciplinado e curte o que faz - e faz bem. O Edson também fez "Querô" e me foi apresentado pelo Adriano. Gostei muito da sua atuação na peça do Folias. Então, o que quero dizer é que estou tranquilo quanto à trupe que vai levantar "Sudatorium". E, antes mesmo do primeiro ensaio, que é amanhã, já agradeço a todos os que estão no barco. Tenho certeza que será um processo muito bacana, apesar de curto. É, porque a peça tem que estar de pé em duas semanas (!), já que a apresentação é na virada do domingo 1 para a segunda 2 de novembro, à 0h30. Feriado? Bobagem. Quero ver todo mundo lá! Será no Teatro do Ator, na Praça Roosevelt, 172. Na semana que vem, falo de novo da peça, de como estão os ensaios, e coloco aqui um flyer bem bacana, com os créditos, o local, o horário e tudo mais que todo mundo quer saber. Abaixo, um pedacinho do texto de descrição da peça, que foi encaminhado à comissão de seleção da Satyrianas:

Três amigos de muito tempo estão relaxando, suando em bicas e jogando conversa fora. Papo vem, papo vai, e a temperatura começa a subir. Em todos os sentidos. Antigas rusgas reaparecem em meio ao calor. Pequenas frustrações emergem do suadouro. Quarentões, percebem que chegaram à metade de suas vidas. E, de uma hora para outra, querem passar tudo isso a limpo. No meio de uma sauna.

sexta-feira, 15 de maio de 2009

É AMANHÃ!

"Sudatorium", de Paulo Cunha.
Com Allis Bezerra, Everson Romito e Fabio Takeo.
Direção: Paulo Cunha.
Sábado 16/05, às 15h, no Club Noir (Rua Augusta, 331, Centro).

TEM QUE SUAR

Minha linda e talentosa amiga Lili Ferrari publicou um post muito generoso em seu blog sobre minha peça, "Sudatorium", que será lida amanhã, às 15h, no Club Noir. Ela deu o título "Tem que suar" - que eu roubei para este post aqui, de tão bom que achei. Tá aqui, ó: http://lilianeferrari.com/2009/05/15/tem-que-suar/. Vale a pena dar uma espiada no blog dela. Tem de tudo um pouco. A Lili é uma daquelas pessoas hiperativas, que fazem um monte de coisas - e, no caso dela, faz tudo com muita competência. Ela produz eventos, dá aulas de arte, mantém dois blogs muito concorridos e - talvez a mais linda das atividades - é a mãe atenta e amorosa da Luisa. Ela escreveu um post de Dia das Mães que eu achei muito bonito. Tá aqui: http://lilianeferrari.com/2009/05/10/mae-chorona/. A Lili é uma mãe moderna. Eu acho legal mães modernas.

terça-feira, 12 de maio de 2009

A HORA DA SAUNA


Neste sábado, 16/05, acontece a leitura dramática da minha segunda peça, "Sudatorium". Será às 15h, no Club Noir (onde as coisas rolam). A história se passa numa sauna. Três amigos de muito tempo estão lá relaxando, suando em bicas e jogando conversa fora. Papo vem, papo vai, e a temperatura começa a subir. Em todos os sentidos. Antigas rusgas reaparecem em meio ao calor. Pequenas frustrações emergem do suadouro. Quarentões, percebem que chegaram à metade de suas vidas ("resta agora a metade pior", como costuma dizer um amigo meu). E, de uma hora para outra, querem passar tudo isso a limpo. No meio de uma sauna. Para a leitura convidei três ótimos atores, que leram lindamente no ensaio de ontem à tarde. São eles: Allis Bezerra, Everson Romito e Fabio Takeo. Os dois primeiros são meus colegas de elenco no "Carícias". O Fabio é meu companheiro de Grupo XIX (teremos boas surpresas em outubro). Eles serão, respectivamente, Cláudio, Beto e Aldo, os personagens da minha peça. Os três homens que estão suando e tirando suas máscaras em "Sudatorium". Desde já, agradeço a eles por dar vida ao meu texto.

"Sudatorium", de Paulo Cunha.
Com Allis Bezerra, Everson Romito e Fabio Takeo.
Direção: Paulo Cunha.
Sábado 16/05, às 15h, no Club Noir (Rua Augusta, 331, Centro).

sábado, 2 de maio de 2009

MISSÃO CUMPRIDA

Terminei "Sudatorium". É minha segunda peça. "Sakurá", a primeira, foi escrita em 2004, sob orientação do Samir Yazbek. Recebeu uma leitura dramática no Teatro do Centro da Terra, no mesmo ano. A Helena estava no elenco. Ela fazia a Clara, a personagem feminina da peça. Ainda guardo boas lembranças daqueles tempos. Mas agora está tudo meio distante. Apenas cinco anos se passaram, mas parece bem mais. Sakurá é o florescer das cerejeiras, fenômeno que marca a entrada da primavera no Japão. Eu morei um ano e meio no Japão. Vivi um sakurá particular, quando meu inverno cinzento se transformou de um dia para o outro numa linda primavera cor-de-rosa. Mas isso é outra história. No momento, quero falar de uma sauna. Um lugar apertado, sufocante e insuportavelmente quente. É nesse ambiente que três amigos discutem suas vidas - ou o que sobrou delas. São amigos há 25 anos, mas às vezes parece que não se conhecem. Comecei a revisar a peça às duas da madrugada. Achei que resolveria tudo em duas ou três horas de trabalho. No meio da revisão, percebi que havia partes que precisavam ser reescritas. Idéias surgiram durante a (re)escritura. Boas idéias. Soluções que estavam pendentes finalmente apareceram. Trabalhei até às 9 da manhã. Vou passar o sábado insone. Como um zumbi. Não tem problema. "Sudatorium" está pronta e é o que interessa. Logo mais vou apresentá-la ao Roberto Alvim, que junto com o nosso grupo de dramaturgia do Club Noir (que ele dirige), fará suas sempre pertinentes observações. Dia 16 ela receberá uma leitura, no palco do Club Noir. Como falei num post recente, ainda estou procurando os três atores que farão os personagens Aldo, Beto e Cláudio. Espero que esta peça, assim como "Sakurá", tenha uma boa carreira. Pretendo montar pelo menos uma delas ainda neste ano. Inscrevê-la em festivais, concursos, etc. Tentar apresentá-las no Satyrianas. E por aí vai. A rubrica de abertura de "Sudatorium" está logo abaixo. Estou feliz.

Uma pequena sauna seca. Paredes de madeira escura, chão e teto também de madeira. Pouca iluminação, em tom amarelado. Há três bancadas, em forma de andares. Em uma das paredes, um relógio. Em outra, perto da porta, um termômetro marca 60 graus. No chão, num canto, pedras queimando, encharcadas por uma essência de eucalipto. Um forte odor da planta toma conta do ambiente. Três homens conversam animadamente. São amigos há muito tempo. Aldo e Beto estão nus, sentados sobre uma pequena toalha branca. Cláudio está de sunga, com a toalha amarrada na cabeça. A cena começa com Aldo e Beto discutindo em tom amistoso, meio de gozação, típico de quem tem intimidade. Cláudio não participa, parece estar distraído, em outro mundo.

quarta-feira, 29 de abril de 2009

CARÍCIAS


Entramos na reta final. Mais uma semana de ensaios praticamente todos os dias, incluindo o feriado. É aquela fase do frio na barriga, às vésperas de estrear. Estou falando de "Carícias", peça que estamos ensaiando há três meses e que entra em cartaz na próxima quinta, dia 07 de maio. O texto é do espanhol Sergi Belbel, um dos maiores dramaturgos contemporâneos. A direção é do Roberto Alvim e a preparação de atores, da Juliana Galdino. Os dois comandam o Club Noir, que coordena o projeto e sedia a peça. O Club Noir é um teatro relativamente novo (foi fundado em 2006, pelos dois) e representa hoje, seguramente, um dos principais centros de experimentação e produção teatral do país. O Roberto é um dos diretores mais antenados com o teatro (de qualidade) que se faz lá fora. Tanto que "Carícias" terá uma concepção muito próxima do teatro novaiorquino de vanguarda. Não quero falar muito da peça para não estragar a surpresa, o impacto. (Garanto que haverá um impacto.) Só vou dizer que se trata de relações humanas - ou da precariedade delas. Dito isso, tem a ver com todos nós. Ficaremos dois meses em cartaz. Registro aqui o prazer e a honra de participar de um elenco (somos onze) tão comprometido e talentoso. O flyer de "Carícias" está quase pronto e até o fim desta semana será postado aqui com todas as informações sobre a peça.

E no dia 16, um sábado, tem a leitura da segunda peça de minha autoria, "Sudatorium". É uma primeira versão do texto, que terminei na semana passada. Receber uma leitura logo de cara é interessante, porque dá para ver onde ele funciona e onde não. Diferentemente do texto literário, que se completa na folha de papel, o teatral só se realiza no palco, na interpretação dos atores. Não que ele seja secundário, muito pelo contrário. É que os personagens, na dramaturgia, precisam do ator para lhes dar seguimento. O autor deu-lhes vida, no texto. Mas é uma vida em suspensão. É o ator, por meio da palavra, que arranca o personagem do texto e o atira no palco, dando seguimento a sua "vida". Ainda estou escolhendo os três atores que darão vida a Aldo, Beto e Cláudio, os personagens da minha peça, amigos que falam sobre suas vidas (e, principalmente, sobre a parte delas que não aconteceu) dentro de uma sauna seca. Daí o nome, "sudatorium". Mas ainda é cedo para falar disso. Há tempo ainda.

terça-feira, 7 de abril de 2009

FLUXO DE CONSCIÊNCIA (SARAH KANE'S EXERCISE)

No campo, um homem caminha, solitário. A estrada é deserta. Ou quase. Passa um caminhão. Uma mulher sorri e acena. É bonita. É caminhoneira. Ela oferece carona. O homem aceita. Os dois na cabine do caminhão. Ele, sem destino. Ela ainda não sabe. Conversam sobre coisas comuns, nada de mais. Sobre o tempo. Sobre os tempos. Ele mira as pernas dela, bem torneadas, bronzeadas pelo sol que penetra na cabine. Lindas botas de couro preto, com detalhes prateados. Ela, olhar fixo nos olhos dele. E assim vão embora, conversando, olhando. Ele pensa no mar. O mar é bravo, agitado. Ele pensa, mas tem medo. Tambores na cabeça. Alma agitada. Mundo agitado. De repente, sente uma mão afagar seus cabelos. A mão passeia pelos cachos aloirados. Tem bastante cabelo para um homem da sua idade. Só então abre os olhos. Por um momento, não vê nada. É tudo escuro. O tempo passa mais rapidamente agora. Mais do que antes. Ele considera a possibilidade de ir para o Japão. Tem curiosidade de ver onde o sol se esconde. Logo descarta a ideia. Sonho impossível. Olha a paisagem. Nada tem de oriental. Pertence a algum lugar da América do Sul. O pasto é vasto, gasto. Abasto fica em Buenos Aires ou Santiago? Ele já não vê mais a mulher, nem suas mãos. Mãos que antes afagavam sua vasta (gasta) cabeleira. Está sentado em sua poltrona na sala, em frente à tevê. Nunca saiu de lá. Há cem anos está sentado, na mesma posição, olhos colados na tela. A janela está aberta. Um pouco. Ele se levanta. Começa a dançar com um par imaginário, braços postos no ar. Estaria no céu? Suas bochechas coladas nas dela. Bochechas imaginárias. Ele sorri. Está dançando de rosto colado. Está no céu, não há dúvida. A música fica mais lenta, adquire um tom grave, mais triste. Ele sofre, compasso a compasso. Pega o controle remoto. Passa rapidamente pelos canais. Pela rua passa um bloco de carnaval, tocando uma marchinha. Que dia é hoje? Da semana? Do mês? Que mês é hoje? Que ano é hoje? “Que importa?”, pergunta para si. O samba está no ar, no éter. Ele tenta alguns passos. São equivocados, erráticos. Ele insiste. Tenta. Fracassa. Tenta de novo. Fracassa de novo. Fracassa melhor. Já ouviu isso, não sabe onde. Chega. “Sei o quanto é ridículo”, pensa alto. Sou ridículo. Um homem ridículo, que sonha. “Não vou mais dançar. Nunca mais”. Nem samba, nem rumba, nem mambo, nem tango. Só rock’n’roll. Ou um blues triste. Talvez. Já esteve melhor. Mas também já esteve pior. Bem pior. Olha para a tevê. Vontade de quebrá-la. Nunca mais ver imagens irreais. Olha pela janela. Outra forma de tevê. Imagens reais. Será? Vontade de quebrar a janela. Ou de saltar. Sobe. Escora-se no parapeito. Olha para baixo. Seres minúsculos abaixo de seus pés. Andam de um lado para outro, em frenética correria. Para onde vão? Por que a pressa de chegar? A quem importa? Interessa? Vale a pena pular? Seria um recomeço? Nem tem tempo de hesitar. Fecha os olhos e lança o corpo no ar. Vê a vida passando como um filme, num daqueles clichês batidíssimos. Lembra de coisas antigas, fatos e pessoas. Tudo misturado com o que ainda não aconteceu. “Acho que consegui/ tudo o que sonhei/ E tão bom estar aqui/ Eu sei”, cantarola. Os pés chocam-se com o solo fértil. Já ia esquecendo, mora no térreo. Três pequenos metros, da janela ao chão. Tenta. Fracassa. Tenta de novo. Fracassa de novo. Fracassa melhor. Terá outra chance? Olha para cima e vê a janela. Quer voltar para aquele deserto, aquela estrada, aquela cabine, aquela mulher. Pega o controle remoto e acessa a memória afetiva. Soprano na mente. Violinos, violas e cellos. Está tudo lá. Pano de fundo. À frente está a voz. Voz que não sai da cabeça. Que segue cantando. Ele quer dançar. Não consegue. Os pés estão enterrados no chão. Afundados num enorme formigueiro. Seres minúsculos, ao trabalho! A carne vai sendo consumida. Funde-se ao solo. De onde veio, para onde vai?

quarta-feira, 4 de março de 2009

SOCO NA CARA


Na próxima terça, dia 10/03, vou participar da leitura do texto 'Carícias', do dramaturgo espanhol Sergi Belbel. O encontro faz parte do projeto 'Leituras Encenadas de Dramaturgia Contemporânea', da companhia teatral Club Noir - da atriz Juliana Galdino e do diretor e dramaturgo Roberto Alvim. É uma boa oportunidade de conhecer um texto instigante, poderoso, de um dos mais importantes dramaturgos da atualidade. Texto que estamos ensaiando desde fevereiro para montar em fins de maio, no palco do Club Noir, com direção do Roberto e com a Juliana na preparação dos atores.

Preciso falar alguma coisa sobre esse Sergi Belbel. Há mais de um mês estou envolvido com esse texto, 'Carícias'. Lendo, relendo, ensaiando. É um soco na cara. Bem no meio. Por meio de cenas aparentemente sem nexo, o autor trata da precariedade das nossas relações. Marido e mulher, mãe e filha, filho e pai, velho e amante, e por aí vai. Os personagens não têm nome. Não precisam. Podemos dar os nomes que quisermos. Podemos dar nossos próprios nomes - porque esses personagens somos nós. É da precariedade das NOSSAS relações que o texto trata. Por mais que isso incomode. E, podem apostar, incomoda. Os diálogos são excepcionais (trata-se de um mestre), de uma aparente banalidade. Só que há uma estranheza no ar, por trás de cada frase, cada intenção. De uma certa forma, os diálogos são dois monólogos, porque raramente se ouve o que o outro está falando. O que importa é que falemos. Os personagens querem falar, querem ser ouvidos - e não ouvir. Alguma semelhança com nossa realidade, na família, no trabalho, entre amigos? Mas não vou ficar contando a peça. Melhor é assistir. Mas vão preparados, com estômago. Aviso de amigo.

O flyer com a programação completa está aí em cima, abrindo o post. Há outras leituras também, de outros textos, sempre às terças e quintas. O Club Noir fica na Rua Augusta, 331, quase esquina com a Rua Caio Prado. É no chamado "Baixo Augusta", onde as coisas acontecem ultimamente.

quinta-feira, 26 de fevereiro de 2009

CENÁRIO

Terra arrasada. Um deserto. Árvores destruídas, sem vida. Pedaços de corpos espalhados pelo chão. No canto (sob iluminação fraca), uma cama, onde um homem nu observa ao redor. A seus pés, jaz uma criança, com uma boneca de pano nos braços. Ao lado da cama, uma pilha de livros. Há fotos espalhadas pelo chão, próximos à cama.

segunda-feira, 16 de fevereiro de 2009

MONÓLOGO

Quarto de hospital. Cheiro de hospital. Um leito. Um moribundo. Está sozinho no quarto.

- Carcaça. Carcaça podre e mal cheirosa. Uma existência que não se deu. Mero acúmulo de anos. Nada mais. Agora é esperar pela única coisa real, concreta, numa vida inteira. Já posso ver vocês, aves imundas. Venham comer, venham. Acham que tenho medo? Vocês trazem alívio em suas asas negras. Continuam a me espreitar? (Gritando.) Vão embora! Vão embora! Sumam daqui!

Entra uma enfermeira. Observa o moribundo em seu delírio. Para diminuir seu sofrimento, aplica-lhe mais uma injeção de morfina.

- Uma criança. Não passo de uma criança agora. (Vê a imagem da mãe.) Sim, mãe, já acordei, não precisa chamar mais. Já estou descendo para o café. O papai está esperando no carro? Já? Que mania! Odeio acordar cedo para ir à escola. Já estou descendo! Dói menos agora. Ainda bem. Diria 'graças a deus' anos atrás, anos da infância. Você ensinou assim, mãe. Lembra? Mas agora é só 'ainda bem'. Dói menos, AINDA BEM. Eu desaprendi. Ou melhor: quis desaprender. Todas as suas rezas e tudo o mais que você me ensinou. Cortei os laços. Não há mais vínculo. Não há mais mãe. Não há mais nada. Dói menos agora, ainda bem. Já não sinto nada, graças a d... Ainda bem. Você diria que um anjo está vindo para me buscar, não é, mãe? Mas não vejo anjo nenhum. Também não vejo mais os abutres, os urubus. Para onde foram? Não há mais carcaça aqui, apenas uma criança mostrando os dentes. Sorrio um sorriso infantil, inocente, porque dor não há mais. Não há mais dor. Não há mais. Não há. Dor.

Silêncio.

segunda-feira, 9 de fevereiro de 2009

FIM DA REALIDADE

- Está chegando o grande dia.
- Acabou.
- Não sei.
- Alguma coisa morreu aqui dentro.
- Você trocou o filtro que estava vazando?
- Comprei flores na feira.
- Eu não esperava tão cedo.
- Se você soubesse o quanto esperei.
- Está indo de vez?
- Você conseguiu dormir essa noite?
- Deixe a chave com o porteiro quando sair.
(Silêncio)
- Quero ir embora.
- Acabou?

sábado, 7 de fevereiro de 2009

UMA CENA

Um quarto sombrio. O Velho está sentado na cama. Além dela, há um armário. São os únicos móveis do quarto.

- Mais um dia. Isso não acaba nunca.

O Velho se levanta e vai até o armário. Pega o único terno que possui.

- Isso aqui foi minha ferramenta quando eu era jovem. Quando eu era vivo. Sete horas e meu café ainda não chegou. Onde está a mulher?

A porta se abre e a Mulher entra no quarto. Ela é um pouco mais jovem que o Velho, mas já demonstra o passar dos anos.

- Chegou o seu café. Fiz umas torradas também. Você precisa se alimentar.
- Trinta anos neste quarto.
- Você precisa se alimentar. Está muito fraco.
- Trinta anos é uma vida.
- Precisa comer. Saco vazio não para em pé.
- Eu costumava dançar.
- É.
- Eu dançava bem.
- Isso foi há muito tempo.
- Quando esse prédio ainda tinha vida. Agora está abandonado.
- Não pensa nisso.
- As pessoas vinham de longe para me ver dançar. O salão aqui em cima ficava lotado.
- Para com isso.
- Aqui era o meu camarim. Eu dava entrevistas.
- Que martírio.
- Agora é apenas um quarto. Um depósito.
- Eu preciso ir.
- Depósito de ossos.
- Vou embora.
- Eu sei.
- Você vem hoje?
- Você sabe que eu nunca vou.
- Eu sei.

A Mulher sai. O Velho senta-se na cama e fica olhando para o terno no armário.