terça-feira, 26 de maio de 2009

THE LAST DAY OF OUR ACQUAINTANCE*

Terminaram por telefone. Um beijo frio de manhã cedo e a promessa de voltar a conversar à noite ou talvez no dia seguinte, o que nunca aconteceu. O beijo gelado selou a relação, restou como o último contato físico entre os dois. A tampa do caixão. O telefonema dela, naquela mesma noite, pegou ele de surpresa. Não conseguiu dizer o que pensava, o que queria. Não sabia o que querer, o que pensar. Não disse quase nada. Ela, o necessário. Continuaram vivendo na mesma cidade, mas os dias dela tornaram-se ensolarados, festivos; ele mergulhou num inverno cinzento sem perspectiva de primavera. Quando se conheceram, anos antes, ela não estava bem, convivia com uma dor que não sabia de onde vinha. Era uma menina frágil, carente de atenção, que sempre via uma imagem distorcida quando olhava para o espelho (ou para dentro de si). Ele achou que podia ajudá-la. Não sabia como, apenas ficou ao seu lado. Confortada, ela o encheu de amor. Pelo menos, parecia amor. Ele não sabia lidar com todo aquele amor, sentia-se sufocado. À noite, ela costumava abraçá-lo na cama, no que ele delicadamente (às vezes, nem tanto) se desvencilhava. Ele sentia-se responsável por retribuir aquele excesso de amor, tentava e não sabia se conseguia. Não sabia se o que tinha para dar era suficiente. Dava o que tinha, mas sentia-se sempre em débito. De repente, esse débito transformou-se em culpa. Ele travou. Não conseguia mais traduzir fisicamente o seu amor por ela. Talvez seu amor fosse diferente do dela. Continuaram juntos por mais um tempo, numa relação afetuosa, porém fria. Até o dia do tal telefonema. Depois disso, tudo mudou. Ela ficou alguns centímetros maior, ele alguns metros menor. Tudo ficou escuro. A visão turva. Tão turva a ponto de ele sugerir numa noite, os dois sentados numa mesa de bar, uma nova tentativa. Ela rechaçou e ele, pela primeira vez, notou nela um certo prazer quando mastigou as palavras que compunham a negativa. Dez minutos depois, ele já estava arrependido daquela conversa. Mas ele precisava dela. Ela o acostumou mal com aquele excesso de amor. E, então, quando ele ficou de luto, ela não estava mais lá, ao seu lado. Estava longe. E ele precisava dela como nunca precisou antes de alguém. E ela não estava lá. Para que dissesse a ele as mesmas palavras, para que desse a ele o mesmo conforto que ele deu a ela durante o luto dela. Mas ela não estava lá. Ele quase a odiou. Preferiu odiar o tempo, o acaso. A assimetria do destino. Um belo dia, ele decidiu: ela morreu. Ele a matou. E resolveu se matar também. Só que ele já estava morto e não sabia. Ela o havia matado. E foi preciso essa sequência de mortes para que eles pudessem, então, renascer.

* Para melhores resultados, leia ouvindo/vendo isso aqui: http://www.youtube.com/watch?v=Sy-Ynf5zvdI

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